No princípio, foi o pecado...
Em 1508, por encomenda do Papa Júlio II, Miguel Ângelo iniciou uma das suas obras mais grandiosas – a decoração do tecto da Capela Sistina, no Vaticano. Doze frescos e muita tinta depois, Miguel Ângelo chegou a um dos mitos mais poderosos da cultura ocidental e deu-nos este O pecado original e a expulsão do Paraíso (1509-1510).
Porquê esta demora? Em primeiro lugar, é preciso não esquecer que Miguel Ângelo é, acima de tudo, um escultor. Antes desta encomenda papal, contam-se pelos dedos de uma mão os quadros que dele se conhecem. Perante a importância do tema a abordar, é natural que tenha decidido ganhar experiência, alterando a cronologia bíblica e ocupando-se primeiro de outros temas. Tanto mais que a abóbada da Capela Sistina se encontra a uns bons 20-30 metros de altura e, para que as cenas sejam visíveis do solo, é necessário um bom domínio da perspectiva e da composição pictórica. De facto, observando os frescos anteriores, verifica-se um progressivo domínio do espaço, do traço e da cor, até atingir a profundidade e monumentalidade deste O pecado original e a expulsão do Paraíso.
O que mais impressiona neste fresco é a combinação, num só plano, de dois momentos distintos sem que haja qualquer descontinuidade espacial ou temática. Nesta história, há claramente um antes e um depois, há a tentação e há o tempo de sofrer as consequências desse acto.
O momento da tentação é particularmente rico em pormenores. Um dos mais surpreendentes é a própria figuração do pecado. A serpente não é representada como tal, nem só com cabeça de mulher, mas sim com corpo feminino que encontra o seu reflexo na posição reclinada de Eva, a sugerir a sensualidade e o erotismo habitualmente associados ao pecado. Miguel Ângelo, contudo, baralha os dados e distribui a culpa por todos: Adão, ele próprio, ergue-se para colher o fruto da árvore proibida em vez de apenas aceitar a maçã das mãos de Eva. Aliás, basta olhar para aqueles corpos para perceber isso mesmo: são corpos com músculos, com carne, com volume – são corpos com vida, que despertam o desejo, o erotismo, o amor talvez! Ou será por acaso que Adão se parece tanto com Apolo, o deus grego do amor?
Depois, é o castigo por desobedecerem a Deus. Adão e Eva são expulsos do Paraíso pelo anjo, simbolizando aqui a vingança, que parece surgir da árvore – tal como a serpente!
Adão e Eva são expulsos para onde? Para uma terra nua e fria. E aqui revela-se o génio de Miguel Ângelo: os dois momentos da história estão no mesmo plano da pintura, sugerindo uma continuidade no tempo e no espaço. E como consegue isso? Simplesmente prolongando o céu e a terra para a direita da composição.
Essa terra nua e fria contrasta claramente com o espaço do Paraíso, um espaço acolhedor marcado pelo tronco da árvore, pela ramagem e pelas rochas. O conjunto sugere claramente uma “casa”, um abrigo, significando isso a protecção divina. Pelo contrário, fora do Paraíso há apenas espaço vazio. E é esse o castigo: Adão e Eva ficaram entregues a si próprios, sem o amparo e a protecção de Deus. As consequências do pecado são bem visíveis nos seus rostos envelhecidos e sofredores, nos seus corpos quase sem vida, no gesto de auto-protecção de Eva. Mas, afinal, Miguel Ângelo tem piedade dos seus personagens, tanto mais quanto ainda lhes resta um pouco da inocência primitiva: a habitual folha de parreira a tapar o sexo de Adão ficou na árvore!
Fiquem bem. Vemo-nos por aí...
Porquê esta demora? Em primeiro lugar, é preciso não esquecer que Miguel Ângelo é, acima de tudo, um escultor. Antes desta encomenda papal, contam-se pelos dedos de uma mão os quadros que dele se conhecem. Perante a importância do tema a abordar, é natural que tenha decidido ganhar experiência, alterando a cronologia bíblica e ocupando-se primeiro de outros temas. Tanto mais que a abóbada da Capela Sistina se encontra a uns bons 20-30 metros de altura e, para que as cenas sejam visíveis do solo, é necessário um bom domínio da perspectiva e da composição pictórica. De facto, observando os frescos anteriores, verifica-se um progressivo domínio do espaço, do traço e da cor, até atingir a profundidade e monumentalidade deste O pecado original e a expulsão do Paraíso.
O que mais impressiona neste fresco é a combinação, num só plano, de dois momentos distintos sem que haja qualquer descontinuidade espacial ou temática. Nesta história, há claramente um antes e um depois, há a tentação e há o tempo de sofrer as consequências desse acto.
O momento da tentação é particularmente rico em pormenores. Um dos mais surpreendentes é a própria figuração do pecado. A serpente não é representada como tal, nem só com cabeça de mulher, mas sim com corpo feminino que encontra o seu reflexo na posição reclinada de Eva, a sugerir a sensualidade e o erotismo habitualmente associados ao pecado. Miguel Ângelo, contudo, baralha os dados e distribui a culpa por todos: Adão, ele próprio, ergue-se para colher o fruto da árvore proibida em vez de apenas aceitar a maçã das mãos de Eva. Aliás, basta olhar para aqueles corpos para perceber isso mesmo: são corpos com músculos, com carne, com volume – são corpos com vida, que despertam o desejo, o erotismo, o amor talvez! Ou será por acaso que Adão se parece tanto com Apolo, o deus grego do amor?
Depois, é o castigo por desobedecerem a Deus. Adão e Eva são expulsos do Paraíso pelo anjo, simbolizando aqui a vingança, que parece surgir da árvore – tal como a serpente!
Adão e Eva são expulsos para onde? Para uma terra nua e fria. E aqui revela-se o génio de Miguel Ângelo: os dois momentos da história estão no mesmo plano da pintura, sugerindo uma continuidade no tempo e no espaço. E como consegue isso? Simplesmente prolongando o céu e a terra para a direita da composição.
Essa terra nua e fria contrasta claramente com o espaço do Paraíso, um espaço acolhedor marcado pelo tronco da árvore, pela ramagem e pelas rochas. O conjunto sugere claramente uma “casa”, um abrigo, significando isso a protecção divina. Pelo contrário, fora do Paraíso há apenas espaço vazio. E é esse o castigo: Adão e Eva ficaram entregues a si próprios, sem o amparo e a protecção de Deus. As consequências do pecado são bem visíveis nos seus rostos envelhecidos e sofredores, nos seus corpos quase sem vida, no gesto de auto-protecção de Eva. Mas, afinal, Miguel Ângelo tem piedade dos seus personagens, tanto mais quanto ainda lhes resta um pouco da inocência primitiva: a habitual folha de parreira a tapar o sexo de Adão ficou na árvore!
Fiquem bem. Vemo-nos por aí...
4 Comments:
jorge parabéns, está espectacular!Mas sabes que denoto um certo ar masculino nessa Eva, demasiados músculos e formas pouco curvilíneas.Um rosto também pouco feminino!Parece mais um homem com umas pretuberâncias a simular seios.A maior parte dos artistas são homossexuais, talvez ele tenha intencionalmente pintado dois Adãos.
beijos
Agora que falas nisso, fui ver as fotos e acho que tens uma certa razão. Talvez seja da reprodução, que não está suficientemente nítida. Ou talvez seja o que dizes: Miguel Ângelo resolveu gozar com a religião e pintou dois homens... Já não estou é de acordo com a tua afirmação de que a maior parte dos artistas são homossexuais. O que tem a arte a ver com as escolhas sexuais de cada um - que, ainda por cima, parece terem uma forte componente genética (TAC's feitos a cérebros de Homo e heterossexuais revelam nítidas diferenças anatómicas).
Beijinhos
Jorge talvez haja uma certa verdade no que disse,porque um homem sem o lado feminino, talvez não conseguisse exprimir emoções tão belas e intensas.Daí que esses que o conseguem fazer sejam na maior parte das vezes homossexuais.Oscar wilde por exemplo!Mesmo leonardo da vinci á quem acredite que possa ter sido homosssexual etc. Mas claro que isso não lhes tira forma alguma a glória da obra!
Susana, eu não disse que não há artistas homossexuais. Dúvido é que a maior parte o seja. Mas, para termos a certeza, teríamos que lhes perguntar - pelo menos, aos que ainda estão vivos! O que, além do incómodo causado, seria uma seca de todo o tamanho.
Claro que, para se ser artista, tem que se possuir uma enorme sensibilidade para tomar o pulso às coisas do mundo e dos homens e mulheres que o habitam. Devido a uma influência hormonal - a mulher tem mais progesterona que o homem, no qual prevalece a testosterona -, essa sensibilidade e o seu corolário (a expressão desinibida das emoções) manifesta-se mais no sexo feminino. Os homens que mostram idêntico comportamento têm níveis de progesterona acima da média. Não está provado, de modo nenhum, que isso os induza ou leve a sentir atracção sexual por homens. Até porque a sexualidade é um fenónemo complexo, impossível de reduzir a uma explicação linear: resulta de uma "salada" de influências genéticas, ambientais e culturais.
Ah!, é verdade: tenho uma dívida de gratidão para contigo. És a única pessoa que comenta o que escrevo.
Beijinhos
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